PÁG. 2
13 A 19 DE MARÇO | CARTA DA INDÚSTRIA
Eduardo Eugenio Gouvêa Vieira
Presidente do Sistema FIRJAN
OS EMPRESÁRIOS
E O AJUSTE FISCAL
As eleições de 2014 racharam o país, e ele permanece
rachado três meses depois da posse da presidente
reeleita. É evidente o desgaste do governo – um
desgaste de fim de mandato, não de início. É hora
de uma reflexão ampla para que se possa caminhar
para um cenário mínimo de entendimento, sem
ameaças ou bravatas que firam a democracia. O setor
empresarial está disposto a colaborar, mas, para isso, é
preciso que seja ouvido.
De algum modo, é hora de lamber as feridas do
embate eleitoral. A decepção com as medidas
tomadas dias depois da eleição de outubro não
pode autorizar desejos de ruptura dos ritos legais
ou constitucionais. Uma presidente foi eleita e, a
despeito da voltagem elevada do quadro eleitoral,
assumiu com legitimidade da maioria
dos votos brasileiros. Goste-se ou
não, é em torno do governo eleito
pela maioria do voto popular que
se deve procurar firmar um pacto
mínimo de união pela governabilidade.
Ninguém deseja viver por quatro
anos num ambiente irrespirável como
o que nos ronda nestes primeiros
meses de 2015. E, de algum modo,
por mais batido que soe, todos
terão de oferecer sua parcela de
sacrifício para que o Brasil seja
capaz de superar o grave quadro
macroeconômico, resultado de erros
cometidos no primeiro governo
Dilma Rousseff. Eles estão na origem
do quadro de deterioração do qual
já estávamos desacostumados. Desde outubro, os
juros são aumentados progressivamente. A moeda
se desvaloriza. O déficit do comércio exterior atinge
os U$$ 6 bilhões. As projeções de inflação superam
o teto da meta. O país caminha para dois anos
seguidos de crescimento negativo. A Petrobras, de
quem a economia brasileira depende fortemente,
ainda junta os cacos do escândalo de corrupção
cujas investigações não parecem estar perto do fim. A
cadeia de fornecedores da estatal, o setor de óleo e gás
e os estaleiros têm sido amplamente impactados. Muitas
empresas quebrarão. O crédito secou. As tarifas de
energia elétrica dispararam.
Para os empresários, falar em mais tributos é quase
uma agressão. A carga tributária sobre a indústria de
transformação é hoje de 45,4% do PIB. É impossível
suportar. Num contexto como esse, tudo o que se espera
são medidas capazes de desonerar o investimento e
promover o aumento da produtividade. Por outro lado,
o ajuste fiscal é inevitável, e Joaquim Levy é o mais
credenciado a levá-lo adiante. A questão é: como tornar
possível o ajuste fiscal sem comprometer o investimento?
Para isso, é necessário compatibilizar de algum modo
medidas necessárias ao ajuste fiscal
com iniciativas capazes de preservar
ao mínimo a competitividade e a
sobrevivência das empresas.
Até para assumir um sacrifício – mais
um – há que existir perspectiva,
horizonte. O país desaprendeu a lidar
com canetadas. O empresário sério
e responsável nunca disse não ao
que era essencial para o país. Mas
será que não há como alterar esta ou
aquela medida? Não há como propor
uma solução alternativa? Se mais um
sacrifício for pedido, é preciso que se
mostre quanto tempo vai durar e o
que a atividade produtiva pode esperar
como contrapartida para a retomada
da competitividade. O Brasil está mais
pobre porque gastou mais do que podia. Hoje, medidas
amargas são necessárias. Todos terão de contribuir.
É preciso que os poderes da República – Executivo e
Legislativo em particular – estejam igualmente preparados
para o esforço de readequação a tempos difíceis e cuja
travessia não se fará em curto prazo. É importante que a
conta não seja paga tão somente pela população e pelos
empresários que investem e geram empregos.
Artigo publicado no jornal O Globo, em 7 de março de 2015.
Para os
empresários, falar
em mais tributos
é quase uma
agressão. A carga
tributária sobre
a indústria de
transformação
é hoje de 45,4%
do PIB
A
ARTIGO